Guerra das Damas. Água nos Mundos
Pra esse lugar não morrer e a causa ser diagnosticada como Preguiça, eu vou tentar escrever alguns comentários jogados e inúteis sobre todos os filmes que eu assistir (além dos ocasionais posts sobre macacos, Radiohead, a Vida, o que seja. Evolucionismo também, etc). Devidamente inspirado pela mudança atual no blog do homem que assistiu demais.
(evitando Spoilers)
A Dama na Água (M. Night Shyamalan, 2006)
(60)
(DVD)
*Se não fosse pela minha inexplicável disposição a ignorar as óbvias falhas de Shyamalan como escritor (e como ator), a minha nota provavelmente estaria uns 20 pontos a menos. Ele continuamente testa a paciência e inteligência do espectador, usando auto-consciência idiota, como a subtrama do crítico de cinema, para se desviar de ataques e ofensas contra o seu trabalho (e assim, gerando mais ataques e ofensas ainda; bom trabalho, Manoj), ou expondo o tamanho do seu ego - atuando no papel do escritor importante cujo trabalho só será compreendido daqui a 20 anos (quem será?!!) - sem aparentemente se preocupar com o nojo que isso pode causar em qualquer um que saiba que é ele. É ingênuo e imaturo, mas... mais importante ainda, é inofensivo. E ele coloca tanta confiança em tudo que faz (até nas cagadas) que seu filme permanece bem assistível.
*É claro, no centro da bagunça toda está o maravilhoso Paul Giamatti. Ele basicamente salva o filme, mantém o tom equilibrado (tornando as cenas de "suspense" simultaneamente tensas e cômicas, como é apropriado), e é única atuação excelente da obra toda (a Bryce Dallas Howard está competente, mas o papel dela não requer muito [mas eu apoio a decisão do Manoj de deixar ela semi-nua por 90% do filme; bom trabalho, Manoj]).
*Tematicamente, é como se o Shyamalan tivesse achado que ninguém entendeu A Vila, e tomado a decisão de deixar tudo menos sútil e mais esfregado ainda pro seu próximo trabalho. A sereia lá chama História. A porra da sereia chama História. História. Ele ainda usa um prólogo com desenhos pseudo-pré-históricos explicando detalhadamente o subtexto da trama: as sereias (na verdade, "narfs") são como Musas que servem para inspirar os artistas a guiarem a humanidade pelo caminho correto, e fazê-los crer no "impossível" com suas imaginações; mas aí, aparentemente, os homens pararam de ouvir (aka, pararam de "imaginar"/acreditar), e começaram a fazer guerras [o que não faz muito sentido, mas ok], e agora elas tem que se esforçar para voltarem a inspirar os artistas. A "narf" que veio inspirar o Shyamalan para escrever esse filme devia estar defeituosa, ou então era meio retardada. Ele devia ter ligado pro mundo mágico das "narfs" e pedido pra trocar por outra (uma asiática, talvez), ou pelo menos uma devolução do dinheiro.
*Eu acabei de perceber que esse filme pode ser uma metáfora para aquelas coisas de "noivas de encomenda", onde você paga pela internet com cartão de crédito, e a máfia russa te envia uma mulher por encomenda pra você trepar/casar e voltar a se sentir confiante sobre sua masculinidade. Não, eu esqueci: sexo não existe no mundo mágico de Manoj.
*Mas o filme ainda é bastante divertido, de um jeito sessão da tarde dos anos 80, com um "universo próprio", personagens estranhos e peculiares se envolvendo com elementos de fantasia (tipo De Volta Para o Futuro, só que pior e mais pretensioso; ou como Mestres do Universo (aquele filme do He-Man), só que melhor e mais pretensioso). A narrativa não está tão controlada e rígida quanto nos filmes anteriores do diretor, nem a direção - com o diretor de fotografia Chris Doyle amaciando o Night, fazendo um trabalho sútil, usando planos desfocados e cores pastéis, suaves, bem diferente do que ele fazia com o Wong Kar-Wai. E o filme tem mais humor ainda (intencional ou não) do que Sinais. E veja que legal as formas que o Shyamalan explora e ecoa o próprio ato de contar histórias, primeiro com a vovó Koreana tendo que ser traduzida pela filha, e depois a irmã do escritor no banheiro, tendo que interpretar as respostas da narf para o Paul Giamatti. Etc. É um trabalho estranho, curioso, e possivelmente transicional. Eu não faço idéia de onde o nosso querido indiano possa seguir, mas estarei esperando.
Guerra dos Mundos (Steven Spielberg, 2005)
(77)
(terceira vez; primeira em DVD)
*A Dakota Fanning nunca deixa de me impressionar. É como se tivessem feito a remoção do cérebro de uma atriz inteligente de 34 anos de idade e o colocado na cabeça de uma garotinha indefesa, sem deixar cicatrizes. Ela parece saber instintivamente como extrair naturalismo das falas mais banais (principalmente das mais banais, talvez). Veja o jeito que Dakota interage com Cruise no começo, quando ele pede pra ver a farpa que entrou no dedo dela, e ela fica simultaneamente tentando mostrar o ferimento e evitar o toque da mão dele. Ou quando Cruise pergunta desde quando ela tem alergia à manteiga de amendoim, e ela diz "Desde o nascimento" com uma frieza e cinicismo hilariamente calculado.
*A trilha do John Williams durante o primeiro ataque alienígena (lá em New Jersey) é excelente, usando um tema repetitivo, grave e discreto, mas que parece ser o equivalente marciano à famosa trilha de Tubarão (ou algo como um motor de um trator tentando pegar). Mas aparentemente, essa é a única vez que ele usa tal tema no filme. Grande parte do resto é decepcionante, convencionalmente melodioso e staccato. Eu acredito que o filme teria ficado mais forte sem trilha alguma pela maior parte do tempo, usando apenas o tema inicial durante as aparições dos tripods.
*A dicotomia de Individualismo X Altruísmo permanece um pouco subdesenvolvida, mas ainda efetiva. Ainda é difícil acreditar que o momento perturbador climático que ocorre no porão de Ogilvy (sim, aquela cena) está presente num filme pipocão de Hollywood; suas implicações podem ser de pouco interesse pra grande parte da platéia, mas vê-las nesse contexto "inocente" as dão um impacto maior ainda do que vê-las num filme de arte, sem aspirações óbvias de entretenimento. Digo o mesmo pra cena - igualmente perturbadora, e talvez minha favorita do filme - da multidão tentando roubar o carro do Ray & Cia. (e o resultado horrível). Pra contrabalancear, o Koepp (o roteirista) e Spielberg inserem momentos (merecidos) do povão se ajudando - a coletora de sangue avisando que já recebeu mais do que precisa; Robbie ajudando as pessoas a subir na barca; um grupo puxando o Cruise durante a cena da "Sabotagem Anal" (sim, aquela cena), etc - e todos levemente emocionantes.
*O filme definitivamente perde parte do impacto na telinha (duh). Por mais absurdamente foda que a cena do ataque inicial seja, ver aqueles carros voando e caindo quase em tamanho real no cinema dá o empurrãozinho de "eu talvez venha a mijar nas calças" para "eu mijei nas calças".
(evitando Spoilers)
A Dama na Água (M. Night Shyamalan, 2006)
(60)
(DVD)
*Se não fosse pela minha inexplicável disposição a ignorar as óbvias falhas de Shyamalan como escritor (e como ator), a minha nota provavelmente estaria uns 20 pontos a menos. Ele continuamente testa a paciência e inteligência do espectador, usando auto-consciência idiota, como a subtrama do crítico de cinema, para se desviar de ataques e ofensas contra o seu trabalho (e assim, gerando mais ataques e ofensas ainda; bom trabalho, Manoj), ou expondo o tamanho do seu ego - atuando no papel do escritor importante cujo trabalho só será compreendido daqui a 20 anos (quem será?!!) - sem aparentemente se preocupar com o nojo que isso pode causar em qualquer um que saiba que é ele. É ingênuo e imaturo, mas... mais importante ainda, é inofensivo. E ele coloca tanta confiança em tudo que faz (até nas cagadas) que seu filme permanece bem assistível.
*É claro, no centro da bagunça toda está o maravilhoso Paul Giamatti. Ele basicamente salva o filme, mantém o tom equilibrado (tornando as cenas de "suspense" simultaneamente tensas e cômicas, como é apropriado), e é única atuação excelente da obra toda (a Bryce Dallas Howard está competente, mas o papel dela não requer muito [mas eu apoio a decisão do Manoj de deixar ela semi-nua por 90% do filme; bom trabalho, Manoj]).
*Tematicamente, é como se o Shyamalan tivesse achado que ninguém entendeu A Vila, e tomado a decisão de deixar tudo menos sútil e mais esfregado ainda pro seu próximo trabalho. A sereia lá chama História. A porra da sereia chama História. História. Ele ainda usa um prólogo com desenhos pseudo-pré-históricos explicando detalhadamente o subtexto da trama: as sereias (na verdade, "narfs") são como Musas que servem para inspirar os artistas a guiarem a humanidade pelo caminho correto, e fazê-los crer no "impossível" com suas imaginações; mas aí, aparentemente, os homens pararam de ouvir (aka, pararam de "imaginar"/acreditar), e começaram a fazer guerras [o que não faz muito sentido, mas ok], e agora elas tem que se esforçar para voltarem a inspirar os artistas. A "narf" que veio inspirar o Shyamalan para escrever esse filme devia estar defeituosa, ou então era meio retardada. Ele devia ter ligado pro mundo mágico das "narfs" e pedido pra trocar por outra (uma asiática, talvez), ou pelo menos uma devolução do dinheiro.
*Eu acabei de perceber que esse filme pode ser uma metáfora para aquelas coisas de "noivas de encomenda", onde você paga pela internet com cartão de crédito, e a máfia russa te envia uma mulher por encomenda pra você trepar/casar e voltar a se sentir confiante sobre sua masculinidade. Não, eu esqueci: sexo não existe no mundo mágico de Manoj.
*Mas o filme ainda é bastante divertido, de um jeito sessão da tarde dos anos 80, com um "universo próprio", personagens estranhos e peculiares se envolvendo com elementos de fantasia (tipo De Volta Para o Futuro, só que pior e mais pretensioso; ou como Mestres do Universo (aquele filme do He-Man), só que melhor e mais pretensioso). A narrativa não está tão controlada e rígida quanto nos filmes anteriores do diretor, nem a direção - com o diretor de fotografia Chris Doyle amaciando o Night, fazendo um trabalho sútil, usando planos desfocados e cores pastéis, suaves, bem diferente do que ele fazia com o Wong Kar-Wai. E o filme tem mais humor ainda (intencional ou não) do que Sinais. E veja que legal as formas que o Shyamalan explora e ecoa o próprio ato de contar histórias, primeiro com a vovó Koreana tendo que ser traduzida pela filha, e depois a irmã do escritor no banheiro, tendo que interpretar as respostas da narf para o Paul Giamatti. Etc. É um trabalho estranho, curioso, e possivelmente transicional. Eu não faço idéia de onde o nosso querido indiano possa seguir, mas estarei esperando.
Guerra dos Mundos (Steven Spielberg, 2005)
(77)
(terceira vez; primeira em DVD)
*A Dakota Fanning nunca deixa de me impressionar. É como se tivessem feito a remoção do cérebro de uma atriz inteligente de 34 anos de idade e o colocado na cabeça de uma garotinha indefesa, sem deixar cicatrizes. Ela parece saber instintivamente como extrair naturalismo das falas mais banais (principalmente das mais banais, talvez). Veja o jeito que Dakota interage com Cruise no começo, quando ele pede pra ver a farpa que entrou no dedo dela, e ela fica simultaneamente tentando mostrar o ferimento e evitar o toque da mão dele. Ou quando Cruise pergunta desde quando ela tem alergia à manteiga de amendoim, e ela diz "Desde o nascimento" com uma frieza e cinicismo hilariamente calculado.
*A trilha do John Williams durante o primeiro ataque alienígena (lá em New Jersey) é excelente, usando um tema repetitivo, grave e discreto, mas que parece ser o equivalente marciano à famosa trilha de Tubarão (ou algo como um motor de um trator tentando pegar). Mas aparentemente, essa é a única vez que ele usa tal tema no filme. Grande parte do resto é decepcionante, convencionalmente melodioso e staccato. Eu acredito que o filme teria ficado mais forte sem trilha alguma pela maior parte do tempo, usando apenas o tema inicial durante as aparições dos tripods.
*A dicotomia de Individualismo X Altruísmo permanece um pouco subdesenvolvida, mas ainda efetiva. Ainda é difícil acreditar que o momento perturbador climático que ocorre no porão de Ogilvy (sim, aquela cena) está presente num filme pipocão de Hollywood; suas implicações podem ser de pouco interesse pra grande parte da platéia, mas vê-las nesse contexto "inocente" as dão um impacto maior ainda do que vê-las num filme de arte, sem aspirações óbvias de entretenimento. Digo o mesmo pra cena - igualmente perturbadora, e talvez minha favorita do filme - da multidão tentando roubar o carro do Ray & Cia. (e o resultado horrível). Pra contrabalancear, o Koepp (o roteirista) e Spielberg inserem momentos (merecidos) do povão se ajudando - a coletora de sangue avisando que já recebeu mais do que precisa; Robbie ajudando as pessoas a subir na barca; um grupo puxando o Cruise durante a cena da "Sabotagem Anal" (sim, aquela cena), etc - e todos levemente emocionantes.
*O filme definitivamente perde parte do impacto na telinha (duh). Por mais absurdamente foda que a cena do ataque inicial seja, ver aqueles carros voando e caindo quase em tamanho real no cinema dá o empurrãozinho de "eu talvez venha a mijar nas calças" para "eu mijei nas calças".
5 Comments:
Eu não entendo porra nenhuma de cinema, mas esse Guerra dos Mundos é bom aos montes.
O foda é eu não ter a sensibilidade para analisar coisas que deveriam ser analisadas, tal qual a porra da trilha sonora. Eu só presto atenção se eu já conhecer a música, ou se ela combinar perfeitamente com o que está acontecendo na cena.
A Dama na Água é divertido e foda-se a subtrama-mega-subetexto-inserido-descaradamente-na-(porra)-das nossas-caras
MAs ficou bonitinho seus comentários, embora eu ache que nem você sabe o que achou do filme. E sim tem vício de lingugem.
Beijokas
Wanderson, eu também não faço muita idéia de como analisar trilhas sonoras; só deixei aquele comentário lá porque aquele tema inicial me impressionou.
Por favor, Pips, expanda nesse "Você nem sabe o que achou do filme". Como eu poderia deixar mais claro? Esfregando na sua cara, como o subtexto de ADNA?
Luis leia a frase corretamente!
O significado não mudou magicamente.
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